05 dezembro 2013

Amanhã


"Reminiscence III". Minjae Lee.



Hoje rezei para o mundo acabar. Desculpe-me mãe, desculpe-me pai. Hoje rezei para o mundo explodir. Não sei o que é mais pecado, já não sei se há coisas que sejam mais pecaminosas que outras, já me é difícil colocá-las em hierarquia.
Queria encontrar algo pelo qual lutar, encontrei. Vários algos. Mas já não sei até onde tudo isso vai parar.
Por medo, hoje rezei para o mundo acabar. Por desgosto também, e um tanto de egoísmo. Só não lembro quais outros egoísmos cruzaram meu caminho e me fizeram querer rezar para o mundo acabar.
Toda a dor teria finitude, talvez. Não me levem a mal. Desculpem-me os esperançosos. Hoje eu, realmente, quis um final no mundo colocar. Por um tanto de egoísmo, de desgosto também. Por medo. Amanhã, isso passa... 




28 novembro 2013

[E]n[o]joo

Estômago enojado
enjoado de todo
mal, engole rápido
vomita desconforto

Estômago diluído
em suco gástrico,
gastrite, engole asco
vomita cansaço, tendinite.



27 novembro 2013

.

Eu não corro,
soco a minha

Em ponta de faca, lança
arame farpado

Se tento correr
enfio-me no buraco
morro.



26 novembro 2013

Condicionar-me-ei


Indo


Apartar

Escrevo pra aliviar as dores
porque sei que pudores aqui
não preciso ter

Se lugar não encontro
me levo ao abandono
dos lugares onde caminhei

Se aqueles a quem se destina
não lhe prestam atenção, a rima,
já posso me perder

Perder então eu vou
aliado ao maior amor
errar onde inda não errei.



Teatro

Lugar
onde invento
experimento
testo
Onde vivo
mato
e morro.



Longa noite

Hoje o peito dorme quieto
de todo o bem
que todo alguém
puder lhe oferecer.

Dorme de colo
encostado ao chão.

Hoje o peito dorme inquieto
lembra do gozo
de ter teu rosto
mas tenta esquecer.



Propriedade?

Tudo que é
meu,
seja,
apenas
a memória,
talvez.



Prece

Não há
motivo
preu voltar
ao que foi partido
Não agora.
Espere!
Um pouco mais...

Tento ler
não consigo

Não há
como
tirar a vista
do bonito
Lugar que adentra
a janela
do carro
com vidro
cor de vermelho
laranja (?)
ou azul.

A conversa
atrapalha
a vista
e o livro.
Barulho demais
incomoda
o ouvido.
Clamo
por paz
pra ouvir
o inaudível.



Pressa

Alguém olha
pra baixo
Caminha
Não para
Calçada vira
asfalto
A vida
vira demora.



15 outubro 2013

.

Guarde numa página
dum livro o rabisco
qu'eu te guardo
no peito. Lembre-se disto
Se algum dia esquecer
do que penso, digo e sinto
Lembre-se que eu
em te amar, insisto.



14 outubro 2013

Delícias dos desesperados

O que manda são as atribuições
as aquisições
quem pode ou não pode
Consegue mais,
se recanta de estirões
Dados aos montes
daqueles sem nomes
que dos nomes correm atrás.

O que fica só tem valia
se dos cantos, melodias
resta o que tem mais quantia
pros bancos, barrancos
e vadias se vender.

Recortado dum mural
colocado no alto
retalha com punhal
a dor amarga daqueles que
sem ver também querem no alto
se privilegiar e viver.

Respeito só se tem
se vigiado por alguém
aos porcos traz agrado
Direito só se dá
se nas mangas o que há
são troféus de brados remendados.



Aos viajantes

Qual é o gosto que a cidade tem?
Repara meu rosto que dela advém
Muda minha cara me reconfigura
Muda minha pele, minha língua
                                               me muda.



.

Coceira é coisa
que anda.

11 agosto 2013

Boemia

Como o último dos bichos
Dos trapos estragados
Seu amor dá-se um fiasco
Pr’eu querer te amar assim

Cancela seu pedido com cautela
Engole seca a sequela
Desse amor de botequim

Daqueles que não são tão refinados
No teu colo escorados
Lembram de te amar pra si

O gosto dos corpos entrelaçados
Deitam e ficam de lado
Seu dia terminou sem mim.



Papel

Há quem escreva quando se entende
Há quem escreva pra se entender

Balela dizer o que eu acho
Se daquilo que faço
também posso me perder.



22 julho 2013

Izabella

Deveríamos descobrir um novo mundo todos os dias, feito Izabella. Cada toque é um tatear diferente por superfícies ásperas, lisas, macias, ou quaisquer que fossem menos ou mais belas.
Assim como o vermelho chega primeiro aos olhos, Izabella chega primeiro a cada um de nós.
- Ai, deixa eu apertar essa bochecha gostosa! – O choro ecoando, disseminando a voz.
          A distração pelas cores torna a facilitar o fim da gemidinha manhosa. O gesto, o riso feito, o apertão, na bunda, de mal jeito.
          - Deixa a criança em paz Madalena!
          - Oxe! Eu só queria brincar um pouquinho com ela!
           Carinha de quem não sabe, ou nos tem muito a ensinar. Olha o céu como miragem, volta, ao movimento, o foco encontrar.  Avião, paraquedas, ventilador, estilhaço.
          - Comigo ela só chora. Não sei mais o que faço!
          - Aquieta e descobre com ela um pouquinho do tempo perdido.
           Os dedos na boca e tudo o mais de importante, o pai fica bobo com tanto sentimento parido.
Chorinho que vira samba, mas não passa de uma bela manha. No colo da tia se empurra, a mãe, que já sabe, continua a nem dar bola. O samba em pagode se transmuta e pro colo da mãe Izabella retorna.



Grade

Não sou daqui
de ninguém
Tudo que além
resta o que de mim sobra
Não vou pra lá
ao que me querem
Não veem que ferem
o peito que no meio dobra.



17 julho 2013

Menino moleque

O tempo ainda há de demorar a apagar da minha mente os traços mulatos daquele moleque banguela que batia à minha porta, aos domingos, a pedir um pedaço de bolo de fubá ainda quente.
        - Toma aqui, menino. – Era de praxe: os pés semi pelados pisoteando, com certa velocidade, a terra esburacada do quintal, rumo ao local de abrigo e descanso. – E não corre assim moleque! Um dia cê estoura a cara todinha!
             Tantas vezes eu avisei, em nenhuma delas ele acatou o pedido de preocupação. Aristides morava a cinco casas, subindo o morro.
              Não fosse esse moleque, minha casa era vazia. Ou cheia de solidão. Coitada era a mãe que, de quatro filhos, sobraram um outro mais Aristides.
- Dá pra imaginar tamanha dor num coração? – Escutava-se frequentemente através das paredes nas casas vizinhas.
Paredes finas demais para vidas saturadas de padecimento.
- Ôh nego, e cê ainda acredita nas estórias desse garoto? - A velha que tinha a cabeceira de sua cama encostada na parede rente ao vaso sanitário do meu banheiro, não bastasse as reclamações acerca do barulho que a tubulação fazia, ainda ficava me botando asneiras na cabeça.
- Aquieta mulher, que dos filhos todos, ele é mais esforçado.
- Mas cê sabe bem porque o irmão mais velho foi morto. – Lembrei-me das paredes finas demais.
Eu queria poder destruir aqueles olhos irônicos. Eu gostava do garoto.
- Não finge não, nego. Cê sabe todo o bafafá que deu na época. E outra, mexeu com coisa errada... já era.
Eu, realmente gostava do menino, do qual o tempo não me deixou aproveitar os trejeitos infantis.
- Eita Aristides, eu lembro de você pequenininho, festejando a vitória de uma pelada.
- Ah seu nego, isso faz uns anos já hein...
- Tempo é coisa que passa, meu filho.
Passa e passa depressa.
- Tempo – Completei – é coisa que não deixa a gente aproveitar a melhor fase da nossa vida.
- Até porque é só depois que ele passa que a gente vai descobrir que aquela era a melhor fase da nossa vida. Né não, seu nego?
- Cê é maroto hein menino...
Aristides cresceu e aprendeu a ser um daqueles malandros que encanta a gente. Ele nunca passou a perna em pessoa que fosse, era um bom rapaz. Sujeito carinhoso. Mas de uma coisa era dotado: uma habilidade tremenda com o locutório.
Guardo com graciosidade uma de suas divagações infantis.
- Seu nego, o senhor sabe de tudo?
- Porque pergunta isso, filho?
- Quando eu crescer, eu quero saber...
- Saber sobre o que exatamente?
- Sobre tudo, oras.
Aquele menino sabia mesmo como me tirar gostosas risadas do peito. Como se no peito fosse onde morassem as risadas.
- Ai seu nego, eu queria saber de tudo... Às vezes eu queria. (...) Não precisa ser tudo sobre tudo, não. Pode ser um pouco de cada coisa. Mas tem que ser de tudo.
Tinha uma confiança em mim esse moleque, que às vezes eu ficava até com medo do que dizer, do que ensinar. Ele sempre aprendeu tudo muito rápido, talvez pela necessidade de acolitar uma mãe solitária, sendo o companheiro de alguém sem companhia, ou talvez pela própria abelhudice.
É ruim pensar que o mundo nos ensina, às vezes, ou muitas delas, pela dor.
- Faz tempo que não te vejo Aristides.
- Oi, seu nego. – cabisbaixo – Não ficou sabendo? Mataram meu irmão.
Que corte na garganta eu senti. O relógio pareceu parar por alguns segundos, retornando a posteriori.
- Como você tá, meu filho?
- Não sei. Eu não tinha muito contato com ele. – Aristides nunca havia usado um tom seco dessa maneira. – Mataram ele lá dentro. E foi polícia. Meu irmão já tinha treta com quase todo mundo. Ontem mataram a família do Borges aqui pra cima mais ele lá na cadeia.
Essa foi uma das vezes em que tive medo do que dizer.
- É filho, ainda tem muito torturado em campos de concentração.
- Como é que é seu nego?
Talvez não fosse hora pra dizer aquilo.
- Nada não, menino. Não é nada.
            Esse moleque de muitos sonhos ainda ia aprender. Nessa vida, não é preciso ter dinheiro pra essas coisas entender.
         Poucos meses fizeram-se sequência. O cheiro do bolo quase pronto aguçava meu estômago, quando Aristides chegou em minha casa com uma agitação exacerbada.
             - Cê tá bem, menino? – Não estava tudo bem.
            - Eu não tenho dinheiro pra bancar os estudos, seu nego! Tô trabalhando, fazendo tudo direitinho, mas não dá! E outra, essa estória de faculdade pública é só pra filhinho de papai! Me diz: como é que eu vou bancar as despesas todas pra poder estudar, me diz?! Além do que, como é que eu vou acompanhar tudo, se no colégio era a várzea de sempre? Isso tudo só serve pra neguinho ganhar dinheiro, seu nego! Só serve pra isso!
          Sentado, sua mente ia longe.
 - Porque que pra conhecer, eu tenho que pagar tão caro? Porque que eu não posso ser aquele sujeitinho que nasce numa casa pobre e se dá bem na vida, igual a gente vê nas notícias da tevê? Eu tinha que ser esse miserável? Não é justo, seu nego. Eu não dou conta de tudo isso, não. Vê só a minha mãe, ela é exemplo do que eu tô falando! A gente luta várias lutas durante uma vida inteira pra que? Só pra conseguir sobreviver?
 Eu queria poder dizer algo contrário do que ele estava pensando. O problema é que eu pensava da mesma forma. Eu queria poder dizer a ele que as coisas iam mudar, que ele ia poder estudar, poder viver bem, longe daquele tumulto todo. Eu queria dizer, mas eu não podia. Minha vida foi assistir, daquela casa, às mesmas estórias se repetirem, ano a ano, com as pessoas mais próximas. Eu não podia mentir pro menino que eu vi crescer. Eu queria dizer diferente, mas não disse. Respondendo a própria pergunta, ele também não falou muita coisa.
- É seu nego, eu acho que é assim mesmo.
                  A cabeça baixa dilacerou-me por dentro.  



03 julho 2013

..

Achei achei achei
                  me perdi
Andei andei andei
                  cheguei
Corri corri corri
                  cansei
Comi comi comi
                  explodi.

Tempo

Isopor é coisa que gruda
Vontade é coisa que passa
Saudade é coisa sem graça
...ou não.
Jabuticaba é coisa que cai
O tempo é coisa que vai.



13 junho 2013

Casamento


Como retomar o contrato
se meu tato pede você pra cá?
Como tomar-te de fato
se meu passo distante está?

do teu colo, teu corpo marcado
amassado, lotado de mim em você
Contrário do lado de fora
que explica a hora, o como e o porquê

Eu não quero mais viver nossa cisma
vou cantar aquela rima que a gente prevê
Já sei que o calor do afeto me anima
me leva pra cima te entregando o buquê.



29 maio 2013

Onde o texto não existe


- Banco molhado dá resfriado? – delirava a voz ingênua do garoto a quem o protegia.

      A praça fizera-se limpa todas as manhãs. À noite, não. À noite os pombos cagavam. Mas pelas manhãs, a vida coloria-se no roçar das rodas, de carros, bicicletas, cestas, com o chão. A feira dava seus frutos de gente numa rua apertada.  Ao nascer daquele dia, os bancos molhados pela noite, ainda refrescavam as calças de um senhor descuidado, ou desatento. Para ele, o jornal talvez estivesse mais interessante a princípio, mas as palavras irritadas e o sacudir revolto do tecido atingido pela poça deflagrou o zelo para com o figurino.
      A criança, prestes a encontrar uma doença nas sequelas dos pingos noturnos, é reprimida em tom selvático e arreda-se do concreto.

- Praça combina com chuva, n’é mãe? – As últimas palavras ressoam em sua mente, esvaziando-a de qualquer outro conteúdo, ou memória.

Abre os olhos posicionados numa cabeça cabisbaixa. Depara-se com a arte musiva do chão. De tronco corcunda e cotovelos apoiados às coxas, revive as lembranças infantis daquele lugar. Rememora a mãe erradamente cautelosa, e o resfriado que não pegou no dia posterior. Rememora a praça, o banco, a feira. Quinze, ou vinte, anos dali se passaram, e agora folhas em rascunho preenchiam suas mãos.
Observador, procurava textos. Metia os olhos nos detalhes a fim de conhecer histórias para tornar em palavras. Além das folhas em branco fazerem-lhe companhia, a caneta teimava rabiscos incompletos. Nada, da mente, saía.
Não se sabe se pela vastidão de sentimentos que saltavam no peito, ou se pela inconstância de motivos, nenhum texto lhe vinha.
O cigarro tenta a frustração afastar.

- Jairo! Quanto tempo, meu amigo! – A voz tonificada não lhe era estranha. – Como anda Helena?

Ao mirar nitidamente, vê um antigo vizinho aproximar-se. O aperto forte do abraço denotou a grande saudade que o velho sentira durante os anos.
      Helena não estava mais presente na casa. Com receio de dizer a verdade, apenas um pensamento tomava conta de Jairo, Quando você não sabe o que responder, você faz o que?. Dentre as opções, preferiu o silêncio.
      Poucas palavras trocadas e o velho já se afastava, com pressa a chegar ao trabalho. Procurando poesia qualquer, Jairo observa os sapatos bem engraxados daquele que partia, criando música pelo andar. Na tentativa de criação, uma ou duas sentenças anotou no caderno.

- Com licença, senhor. Eu posso sentar aqui? – Um saco cheio de gordura em mãos e umas vestes desbotadas caracterizavam o homem de barba esbranquiçada, em pé ao seu lado. – É que... – Uma incerteza tomava conta de sua fala. – De todos os outros bancos, os que num tão ocupados, tão sujos. Eu posso me sentar aqui? É rapidinho... Só até acabar o pastel.

Verdade era a de que a praça não se mostrava limpa como antes. Junto dos anos, veio também o descuido com o local, que deveria destinar-se ao encontro de conhecidos ou não.

- À vontade... A praça é de todos.

- Ah senhor... Não sei. As pessoas adoram tomar as coisas como propriedade.

      Jairo, cujos olhos estranharam aquele diálogo, emudeceu-se. O robusto som de um trepidar cortou a quietude entre os dois. Por perto da praça, trabalhadores chegavam há pouco à missão de derrube de uma árvore de grande porte, antiga e com probabilidade de queda natural.

- Que nem isso aí. – Os dedos grossos do homem apontaram para o instrumento de corte. – As pessoas geralmente pensam que o planeta é delas. Mas o planeta não pertence a elas não, e sim, elas ao planeta.

O pensamento que parecia simplista, poderia fazer toda a diferença aos labores humanos. Simplista era também o modo como a fome atuava no morder e no engolir do homem. Lambuzava-se. Mais barulho de máquinas... E as pálpebras, dos olhos que antes observavam o mastigar do outro, contraem-se por conta do incômodo nos ouvidos.

- Bom, eu vou. – Limpando, com as mãos, os lábios engordurados e o canto da boca com estilhas de fritura. Suas tralhas quase faziam mais barulho que o maquinário cortando a árvore, pelo menos para Jairo, assim o era.

Ao longe era possível notar um caminhar fora de seu prumo. O homem firmava o pisar mais de um lado que do outro. Os joelhos que o asfalto amarfanhou, pensou Jairo. E aquele andar desequilibrado enfiava-se pelas cores e sons da feira, pulava caixas e desaparecia no monte de bocas que abriam e fechavam quase o tempo todo. Sumiu. Não era mais possível distinguir o desbotar da camisa com o das lonas e cabelos das donas vendedoras.
Jairo ficou ali, imóvel.
Tudo pareceu silenciado, por um instante. As bocas fizeram-se mudas, não paradas, mas mudas. Os gestos lentearam-se; quando se pôde ouvir, confundindo-se com um relógio, o compasso do andar de um salto feminino.
Numa das esquinas que dava para a praça, surgiu ela, a figura mais exuberante, talvez, do dia. Chamava, primeiro, a atenção por conta dos panos pendurados no corpo. A roupa parecia ter sido feita por recortes coloridos de tecidos quaisquer e diferenciados. O balançar da saia, junto aos passos, prendia o foco de Jairo no seu mover. Os cabelos falseadamente seus, mal brincavam com o vento. Com corpo de homem e traços de mulher, a maquiagem saltava aos olhos de qualquer um, e delimitava expressões e curvas do rosto. A familiaridade com o salto alto era visível, assim como a cara fechada por algum porquê desconhecido. O porquê, muito provavelmente, ninguém saberia, mas é incrível como a expressão de dor é tão reconhecível aos olhos. E aqueles olhos guardavam a dor de toda uma vida, ou, do calo que o sapato fazia. O pisar firme parecia mostrar pressa ou anseio pelo fim da caminhada. Um escarrar e um cuspir no canto da calçada... Jairo não sabia se aquela figura chegava ou partia, mas acompanhou seu andar por todo o quarteirão, até dissipar-se no muro pichado duma casa velha.
Ao ânimo de poder escrever algo, as palavras fugiam do papel. Mas não poderia deixar que uma poesia se perdesse dessa forma, não agora, não ali; teria que escrever algo, nem que fosse para deixar numa calçada qualquer. Pensou no rosto, na expressão, no cansaço. Suor, escreveu. Corpo que soa, pensou. Espera,... soa? Bom, quem disse que nosso corpo não soa? O meu corpo chega a gritar de vez em quando... Meu corpo inteiro soa. E assim deixou.
Mesmo assim não era o suficiente.
A mente cansada de Jairo desistiu momentaneamente e o levou ao boteco, no caminho de sua casa.

- Um pingado, por gentileza. – Café para acompanhar o cigarro estava bom por ora.

As rugas ressaltavam-se ainda mais pela cara enfezada da velha que atendeu ao pedido. Se estava realmente enfezada Jairo não sabia, mas que o andar dela, nas ancas, doía, ah... doía. O incômodo com as articulações expressava-se por grunhidos quase calados e pelo esforço em transpor um pé ao outro, até alcançar o interior do balcão.
Mais alguém adentra o lugar, bate a mão numa mesa, ao sentar.

- O de sempre! – O cheiro do álcool inundou o estabelecimento.

A velha serve o pedido com brevidade e entrega, num prato, quibe com limão, já espremido. Ela mostrava-se ameaçada com a presença do sujeito.

- Tem muito limão aqui nessa porra! Tira um pouco desse limão... Tira um pouco do limão!

Ninguém moveu um palmo. O rapaz empurra, num mesmo instante, mesa e cadeira ao se levantar.

- Eu não vou pagar por essa merda!

Sai xingando a velha, o limão, ou a própria vida. Resta apenas o prato a titubear, com o quibe espargido, no chão.

- É difícil ficar aqui sozinha, fio. Inda mais num dia desses, sem ninguém. E quando vem algum bêbado igual a esse aí, a gente tem que ficar quieta pra não levar uma surra.

- Ruim ter que arrumar tudo sozinha também, né? – Jairo ajuda-a repondo a mesa no lugar.

- Ah, sim! Não compensa abrir num dia desse não. Só desgasta a gente. – O tempo já havia desgastado muito mais do que a própria faina. – Inda bem que cê tava aqui comigo... Caso contrário, não sei não...

Mais uma vez Jairo optou pelo silêncio, e pelos tragos de um filtro vermelho.
Peito aquecido, pelo café ou pela fumaça, e dinheiro estendido no balcão. Caçando moedas num pote empoeirado, a velha enchia e esvaziava o peito com dificuldade, parecia. Lançava mão de força demais na inspiração e, em contrapartida, soltava o ar como num desoprimir do peito. Deixava o pobre Jairo preocupado com o dia seguinte da velha. E com todos os seus outros dias.

- Aqui está. Muito obrigada, fio. – Surpreendentemente, um sorriso.

Nasceu um sorriso em Jairo. Mas, sorriso é coisa que entra, ou que sai? Tanto faz. Ele abriu a porta da casa com o mesmo sorriso com o qual deixou o boteco. No trajeto, tornou a rememorar coisas. Lembrou-se mais uma vez da infância, e dos tantos outros que passaram por ele. Lembrou-se também do anseio por um texto que pudesse surgir na cabeça.
Jogado num canto da sala, percebeu.

Queira tanto escrever, queria tanto ter uma história para contar, e pensei estar procurando por onde a historia não existia. Não percebemos que às vezes, pra encontrar, temos que esquecer.

Esqueceu que a história já estava se construindo e se fazendo pronta, dentro dele mesmo. Esqueceu, e escreveu.



07 maio 2013

Nós


      Eram dois. Teimosos como um cão sem coleira, ou melhor, dois. Dois cães sem coleira.

      - É.
      - Não. Não é.
      - Confia em mim.
      - Não é, porra!

      Por que certas discussões insistem em terminar por meios ríspidos? Não,... elas não terminam. Tornam-se ilusoriamente terminadas, e recomeçam mais adiante.
      A crise da meia idade os alcançava. Sonhos antigos tornando-se tolos, superficiais ou frustrados. Alimentos vivenciais tornando-se perdas. O outro tornando-se colo, proteção ou desacordo.
      Desavenças geradas por palavras não pensadas, e ao todo, a memória se esvai. A memória de si mesmos.
      Não paramos muito para pensar.

      - A gente machuca.

       E se machuca. Machuca-se tanto, que não dá conta de guardar e tende a vazar para o outro. Seria nossa constância? Desdenhar afeto, pedindo perdão?

      - Eu não tenho culpa sobre a expectativa que você criou. Não tenho culpa se ela não conseguiu abarcar o pouco que eu sou.

       O vazio ecoa as últimas vogais, que no escuro atravessavam paredes. Sentiam-se assim, em determinado momento da vida: vazios dela mesma. Cegos diante um do outro, enxergavam apenas o que lhes convinha, e seus olhos gritavam isso, como um peito gritando ajuda numa noite fria. Antes em qualquer lugar, do que preso. E presos se faziam.
       Às vezes dói deparar-se com a diferença, com o que é vário. Deparar-se com o que a gente não pensa. Sabendo-se que si próprio não mudará de lugar, dói mais ainda. Às vezes dói. E nessas vezes, doía. Ardia o peito quase rasgando, dos dois, rasgados no chão da cozinha.

      - O sol já morreu. Boa noite.
      - Morro todos os dias.

      Sem dúvida, cada dia a mais, era um dia a menos de vida. Mas como contar quantas vidas existem num dia?

      - Quantas vezes você morre num dia?
      - Morro todas as vidas que existem nele. – Um suspiro. – E renasço em cada outra.

       Um diálogo se abre durante a noite. Falando do medo, enxergam-se adiante e no presente, e no passado. Havia transcorrido muito tempo desde que viram os olhos um do outro. É estranha a sensação de ver algo já esquecido. O medo talvez tenha a qualidade de aproximar as pessoas, e, distanciar outras. Perceberam isso quando muitos, dos que ali passavam os dias, já se ausentaram por conta própria, pela impaciência ou pelo medo. Os dois estavam, nitidamente, sozinhos. E a casa, vazia.
       Porém, à medida que os ponteiros completavam suas infinitas voltas, a escuridão fazia-se familiar aos olhos. Algumas luzes não precisavam mais ser acesas. Algumas dores não precisavam mais ser gritadas.
       Eram outros dois agora.
       Ainda ouve-se palavras, com desdém, por aí “Coitados,... aguentaram um ao outro”. Coitados sim, daqueles que não se renovam. Passam em frente à mesma casa todos os dias, e não tocam a campainha. Coitados dos que não sabem que a vida é curta. Recolhem as cartas, limpam as cortinas, mas não se deparam com o cheiro de pó por baixo das camas.
       Juntos ali estiveram, e juntos permaneceram. Dos contrários, fizeram complementaridade. Da morte, um respaldo para a vida.





06 maio 2013

Renúncia

Fala coragem, de toda ilusão.
A grande bobagem da sua canção.
Replica afeto querendo perdão.
Dizendo sincero com espinho na mão.
Mentira qualquer pra fingir afeição.
Pensa que te quero?
É só solidão.



03 maio 2013

02 maio 2013

nAMORo


Eu namoro você numa praça
Namoro olhando as estrelas,
olhando o céu
Namoro você num ponto de ônibus

Namoro em meio ao seu sexo,
aos nossos olhos
Namoro pelo escuro
e em meio à multidão 
Até assim 
eu namoro você.

Dos óculos


Óculos em mãos, água, sabão e papel. Assim que recolheu as últimas gotas d'água das lentes, jogou o pedaço de papel pelo esgoto.
Na escrivaninha improvisada, suas palavras e pensamentos tomavam vida. O que poderia contar aquela escrivaninha?
(...)
Todos os dias, o que mais gostava e sabia fazer, era escrever. E assim o fazia. Com toda simplicidade e rutilância, desenhava palavras com sossego. Palavras que faziam o meu dia mais saboroso.
Não só o meu...
Encantava as pessoas que se aproximavam, ou, elas se aproximavam porque já estavam encantadas.
Seu olhar de amor sempre me chamou a atenção. Um olhar que impulsiona seu próprio ser à vida, ou a atrai pra dentro de si. E me atrai pra perto.

27 abril 2013

25 abril 2013

Alice...



            Suas costas foram as últimas ondas que animaram minha vida. Depois daquilo, o Rio se descoloriu em mim.
          Alice era inquieta, era viva e seus olhos eram a principal parte do corpo onde abrigava a vivacidade existente dentro de si. Ah, aqueles olhos, brilhantes como a lua num céu de abril. Como não notar o inflamar de seus olhos, quando estes eram invadidos por algo que a tocava? Os olhos avermelhados de Alice clareavam-se, em meio ao verde do quintal de minha casa e ao castanho de tardes chuvosas. E aquilo me inundava de gozo.
            Sempre fez-se bela, diante de mim. Todo o tempo em que estivera longe eu não sei, mas diante de mim, fazia-se deslumbrante. O sorriso eu jamais esqueci e nunca notei outro, tal qual aquecesse meu peito. E a ânsia por tudo o que ainda havia não visto, ficou grudada, em parte e de alguma forma, a minha pessoa.
          Falando ainda do sorriso, foi ele que chegou primeiro aos meus olhos. Sorriso este que, por vezes, entrecortado pelo cabelo cor de terra escura, não sei se para a minha admiração ou espanto, abriu-se ao ver-me. Naquele dia eu não chegava a creditar a imaginação de tê-la em meus braços.
                 
          - Esta é Alice. A nossa nova companheira de luta. – Sobre o contexto não convém explicações, apenas que Alice fazia-se presente numa das tantas reuniões do partido o qual eu defendia. O mesmo no qual me decepcionei tempos depois, como acontece em muitas lutas falseadas. A respeito de quem me apresentou a ela, também não é necessário comentários.
          - Oi, muito prazer.  Dante... Dante Emiliano. – Quase misturando as palavras com o último trago do cigarro que acabara de retirar da boca.
          - Prazer, Alice Caetano. – Ah, o sorriso mais uma vez... E a pele do rosto, encostando na minha.
                
          Após este dia, passaram-se muitos outros, junto de outros cumprimentos breves. Alice ficava distante, muito distante para alguém como eu, rapaz sem jeito, sem botas nem armadura, alcançar. Mesmo distante, nunca deixou de se mostrar disposta a encarar os bons costumes de simpatia e educação. Ah, como eu quis aquele abraço, só pra mim...
            Talvez por tanto querer, fui agraciado com sua voz dizendo-me de algo sobre o qual não lembro mais, num dos dias de som alto na Casa da Cachaça. Ainda que muito belo o lugar, rodeado pelos harmônicos casarões da Lapa, o mesmo sucumbia ao chamariz de Alice. Não sei dizer ao certo que aspecto da moça é o que chama mais a atenção, mas que Alice o tem, ela tem, e que o usa  bem, oh... e como usa.
          Dizia do tempo, ou da temperatura, dos semáforos, pontes, aviões ou da música que tocava. Perdi-me num sorriso, e junto a mim mesmo, perdi as palavras que saiam de sua boca. Eu não lembro a respeito do quê dizia, porém aquela mínima troca de ideias fez-me transcender.
                 
         - Que frio. – Agora sim, falou sobre a temperatura! Sua roupa sem mangas permitiu-me notar os pelos ouriçados na pele, que tentava, em vão, aquecer-se a si mesma.
          - Tome, não hei de querer que passe frio.

          Esquecendo a blusa com ela, ao fim da noite, foi claro que bendita blusa, ou bendita falta de memória, contribuiu para a continuação da conversa no dia ulterior. A voz de Alice, devo dizer, não caberia a uma enamorada da commedia dell'arte, mas à marcante personagem que mais nos faz relembrar o espetáculo, quando já em nossas residências repousamos. A voz que era só dela, foi o que fez relembrar-me o afeto de cada momento ali passado.
            Afetou-me sem medir circunstâncias, e quando dei por mim, era ela quem abria a porta de nossa residência após o trabalho de um dia, e quem aquecia o corpo, na cama, em minhas mãos durante a noite fria. Metia-se toda vez a perguntar o que houvera passado em minha cabeça, por tê-la guardado tanto tempo junto do peito, sem ao menos lhe dirigir uma palavra, e mais, perguntava o que me fizera querer, ainda, sua companhia. Deixei de contar as vezes em que a reposta para suas perguntas resumia-se ao fato de que eu a amava. E amo.

          - Eu lhe faço feliz, fica comigo...
          Como que querendo dizer algo, sem saber direito o quê, ela deu o típico suspiro precedente à fala, sem ao menos emiti-la.  
          - Estou dizendo, fica. – Meu desfecho num dos diálogos iniciais entre nós.

           Alice ficou, e fez-se presente nos meus dias. Fez-se presente nos retalhos das memórias de minha vida. Como era gostoso estar ali. Sentir Alice, sua pele, sê-la por alguns instantes. Fui Alice quase o tempo todo. Comi, cheirei e gozei sendo ela.

          - Porque você não vem? – Sua voz mudara com o tempo, ou meus ouvidos já não a escutavam da mesma forma.
          - Estou cansado, desculpe-me. – Eu não queria desapontá-la. Alguém há de saber que, no fundo, eu realmente não o queria. – Mas vá, não perca isso por minha causa.

             Ela foi. Foram-se os dias, carregando consigo a parte, que possuía a mim, dela. Eu, sentado.
          Minha vontade não era a de estagnar em uma sala enclausurada, mas a de não mudar os bons sentimentos vivenciados até então. Pobre de mim, que ainda não havia aprendido os mistérios sobre a mudança humana. A vida é transformação. Não pude prender Alice em minha fantasia utópica de felicidade eternamente única.
           Meu problema maior foi realizar uma promessa na qual eu já não acreditava, desde o momento em que ela saiu da boca, o quê eu não cumpri, o quê eu não dei conta de cumprir. Eu sabia que não faria Alice feliz, embora muito o quisesse.
             Não há palavras para descrever o quanto me doeu enxergar lágrimas sofridas em seus olhos.

           - Você prometeu...



19 abril 2013

Que


Era uma vez um menino
que apanhou do pai; que foi abandonado pela mãe; que se arrependeu, mas foi expulsa de casa; que apanhava todo dia do pai; que chegava bêbado do bar; que quase foi afogado pela mãe; que apanhou do marido; que morrera de dor.

05 março 2013

Suor

A junção dos nossos corpos
se faz em detalhes
se faz em retalhos
Em pedaços misturados de nós dois.

22 fevereiro 2013

O velho


          Contando da dor, me dizia daquilo que não mais tinha. Falou da perda.
- Morreu por negligência... E o enfermeiro ainda disse que eu tava muito nervoso! 
      Aqueles olhos marcados brilhavam e sua lágrima quase escorria junto da minha. A minha porém, deslizou pelo rosto.
- É muita sujeira. Eles jogam tudo pra baixo do tapete.
- E sobra é pra gente limpar.  
        Sobrava pra ele limpar. Reparei no saco preto que ele apoiava cada hora em um dos ombros, mas que, apesar do esforço, as mãos pesadas não deixavam de carregar.
- Escuta... se tem três cachorros: dois fortes de raça e um vira-lata. Qual você chuta primeiro?
         Ele fortaleceu a voz e preencheu seu discurso com argumentos sobre a legislação brasileira e a forma de se fazer política.
- O futuro não pertence mais a mim não. Ele é de vocês, da juventude... Tem que ficar de olhos espertos. Se os caras quiserem pegar alguém, quem cês acham que eles vão pegar primeiro?
- Os vira-latas.
- Bom, não vou atrapalhar. Aproveitem o namoro... Que, eu... ah, qualquer mulher me diverte...
        Assim que ele colocou sua mão no ar, buscando algo brilhante, meus olhos fitaram seus dedos, que nada continham. Passei a imaginar ‘Para quem ele vai? Ou para onde ou o que?’
          Deu alguns passos em direção ao seu destino. Parou. Virou, segurando firmemente aquele saco preto, e exclamou ‘O futuro pertence a vocês, não esqueçam disso não!’. Apontava o dedo para nós, erguendo o braço de forma com que a sombra de sua mão fizesse escuridão em seu rosto. O boné quase escondia seus olhos devido à má iluminação, mas ainda assim era possível ver a expressão forte com a qual enchia a boca para soltar aquelas palavras.
      De costas, tornou a andar para o seu começo ou seu fim, não sei ao certo. Só sei que gravei mentalmente a cena daquele velho surgindo e sumindo por uma rua escura.
       Quase não o conheço. De sua vida eu nada sei. O homem que eu conheço é apenas aquele que aparece durante uns instantes num pedaço de chão feito palco pra minha poesia.

20 fevereiro 2013

O meu mundo

Uma vontade de gritar,
pedir pro mundo me deixar em paz
pr'eu poder deixar
um pouco mais em paz o mundo.

06 fevereiro 2013

Seu rosto no meu




“Vejo seu nome em todos os lugares. Em nenhum deles você está.”
Orlando Pedroso


Deitada na mesma cama ainda posso ouvir seus sons a se fazerem sopro no peito. Embora dessa vez, isso me provoque dor. É um doer tão forte que se torna físico. É um ranger de dentes que destrói os ossos.
Naquela noite fria, e quente, tudo estava abafado. Tudo estava sem rumo. Ou talvez o rumo estivesse sem... sabor, outra vez.
Lembro-me de coisas ditas, sentidas. Lembro-me de você dizer que não havia tido, ou tido pouco, daquilo que mais queria; daquilo que eu mais queria que você tivesse também.
- Você tem, meu velho.
- Tenho não. Cadê?
- Tá aqui. Tá sim.
- Hum... não sei, minha velha. Às vezes não acredito mais, entende?
- Entendo. Mas você tem.

Minhas memórias se confundem numa neblina mental. Ou fumaça, daquele trago.
Quero lhe mostrar coisas para rir, sentir os seus olhos em cima dos meus a me beijar, e sua pele a despir a minha. Tenho piadas a lhe contar, tenho sóis a lhe mostrar num fim de tarde. Tenho tanto e não tenho nada. Falta você aqui, na poltrona ao lado.
Fico com suas expressões estampadas nas minhas, e seus gestos a me coordenarem. Mas falta ainda...
Sua falta me arremete em solidão de palavras, de ânimo e de cor. Aquelas tantas cores dos meus olhos foram embora e ficaram guardadas com você.
As poucas palavras que me restam, ultimamente, não têm um cais para onde se abrigar. Não têm você.

05 fevereiro 2013

Vazio


Jurei partir tantas vezes e em nenhuma delas eu cumpri
estive perto e tão longe de uma vida na qual sempre me vi

T'espero no sol de cada manhã e na chuva de cada tarde
ao vento, pedi que sua presença se fizesse arte
inda que não fosse agora, busquei forças de um covarde pra
mentir a dor que sinto num acróstico de saudade que
exaurindo toda alma, acusa no peito o vazio de sua metade.

31 janeiro 2013

Insônia

Os latejos de minha cabeça incomodam a ponto de não me deixarem dormir.
A falta do teu abraço me impede de sonhar com a chuva, ou o vento, que insistem em partir.

Fim?

Se fez eterno
na multidão
Se fez silêncio
Se fez oposto

ao peito, aperto
ao feito, desfeito
à luz, escuridão.

30 janeiro 2013

Saudade


Fiquei triste porque não te vi, meu velho. Às vezes é tão ruim essa história de um não ver, outro não ouvir. E assim como não me veio sua presença, também não veio a chuva. De que adiantaria lhe trazer a chuva?
A chuva ficou só no cheiro. E no seu cheiro. Aquele que se mistura no meu, lembra? Tão gostoso... eu senti ele agora pouco.
Fiquei deitada na velha cama, te lembrando em pedaços de ‘aluzejo’, digo, azulejo. Que falta você me faz, meu velho. Sentindo o colchão abraçar meu corpo desgastado pelo tempo, ouvia o som que vinha do vento. Ouvia os gritos de uma criança de colo e a fúria de um cão enjaulado. Só não ouvia o som da sua voz, que antes, fazia com que meus pensamentos se acalmassem. Sua voz que às vezes não saía, e ainda assim eu escutava.
Ah, a voz..., que mesmo distante tinha essa capacidade de me acudir e acalentar. Ainda tem, eu sei disso.
Num sonho vivido pela gente, a gente era velho, novo, a gente era tempo, era conforto, era junto. Será que eu vou cuidar de você, meu velho? Será que a gente vai cuidar um do outro?

24 janeiro 2013

Tchau


Eu queria tanto dizer
mas não digo
ele também não diz.

Acho que não precisamos disso
nos entendemos assim.

19 janeiro 2013

Gotas


Minhas lágrimas contêm alguém
que eu quis que estivesse aqui
e não esteve
Contêm as dores e o medo
daquilo que eu não sabia
Contêm o grito que meu corpo silenciou
e mostrou a você
Contêm a falta, a raiva e o gemido
O pulo, a falha e o perdão
Contêm o que não se fez contido
Contém você e um não.

18 janeiro 2013

Escuta [3]

Escuta a mim, nem que  for o meu silêncio,
pois é nele que te digo poesia,
qu'eu encontro toda a minha calmaria
de uma música que não é mais cantada
sozinha.



Em parceria,
R. Batista
A. Stuck

14 janeiro 2013

Junto ao meu

Respirações compassadas
ao ritmo da chuva,
que nos rodeia e nos veste
em pingos de poemas d'água
Faz da pele molhada
fonte de saciedade
da sede que me toma
de seu corpo despido

Toque

O teu gingado
o teu balanço
a tua pele
o teu quadril...

...no meu

06 janeiro 2013

A Paris



Escrevi uma carta de adeus
uma carta que nunca entreguei
para uma pessoa que não mais vi
uma pessoa que não sei
se correu
ou se estava ali

Escrevi uma carta de adeus
retratei todo o mal que fiz
para os meus e os seus
muitos dias de desvarios

Escrevi aquela carta
e à mesa deixei sobreposta
apaguei cada palavra
e reescrevi outras novas

Não me lembro bem os trechos
apenas uma coisa eu escrevi
aquela carta falava
do dia no qual fugi